Sobre “Equity Crowdfunding na Prática”

Nesta última quinta-feira, 25 de junho, tive a oportunidade de participar da mesa de debates do seminário “Equity Crowdfunding na Prática“, realizado pela Revista Capital Aberto na Saint Paul Escola de Negócios. O encontro superou todas as expectativas, com excelentes notícias sobre as possibilidades de financiamento para startups.

Meu caro amigo Walter Pelecchia, do Machado Meyer, abriu o seminário relatando o marco regulatório das captações de capital no Brasil, e fazendo excelentes comparações com as realidades britânica, americana e canadense. Antonio Carlos Berwanger, da CVM, apresentou os pontos de preocupação do órgão regulador a partir do desenvolvimento do mercado e das soluções legislativas ao redor do mundo. Frederico Rizzo, grande parceiro do Broota, mostrou os desafios encontrados pela primeira plataforma do gênero no Brasil. para relatar as diferentes visões dos interessados, o case da Bougue contou com a contribuição do CEO Fernando Canuto, em conjunto com o super angel investor Fábio Póvoa e do gestor da Redpoint E-ventures, Rodrigo Baer.

O público, em sua maioria advogados, saiu com a satisfação de descobrir que é possível adotar essa estratégia de financiamento com benefícios positivos para empreendedores, startups e investidores individuais e institucionais. Será esta a vez em que o Brasil dá lições de maturidade ao compor os interesses dos participantes do ecossistema de empreendedorismo e mostrar que é possível inovar juridicamente? A resposta, na minha visão, é um gritante sim.

Para saber mais um pouco sobre equity crowdfunding, veja os links disponíveis aqui no StartDireito.

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Seminário “Equity Crowdfunding na Prática”

No próximo dia 25 de junho, vou participar da mesa de debates do seminário “Equity Crowdfunding na Prática“, realizado pela Revista Capital Aberto e apoiada por diversas entidades da área de finanças e empreendedorismo. Será uma oportunidade ímpar para discutir esse assunto tão importante para o financiamento de empresas no Brasil. Espero vê-los por lá!

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Criar hoje um produto do futuro

A convite da Revista Cliente S.A., escrevi este novo texto, publicado hoje aqui.

 

Criar hoje um produto do futuro
Às vezes, startups devem procurar oferecer aquilo que as pessoas ainda não sabem que precisam

12/02/2015 15:47

Autor: Flavio Augusto Picchi

Quando se fala em negócios na internet, o mais curioso é a criação de novos mercados inexistentes ou de reinvenção do modo de organização de mercados existentes. Dez anos atrás, seria quase impossível imaginar que um site, que apresenta páginas de pessoas contando seu dia a dia se tornasse uma das plataformas mais eficientes do mercado publicitário mundial e é isso que o Facebook faz. É um modo de organização de informações totalmente novo que, com a ajuda de algoritmos e tecnologias inéditas, permitiu o direcionamento de mensagens publicitárias mais eficientemente do que nunca. Por outro lado, quem diria que cooperativas de táxis ou pequenas livrarias teriam sua própria existência ameaçada pela entrada de empresas como Easy Taxi ou Amazon? Sempre houve uma maneira de chamar um táxi ou comprar um livro e a internet permitiu que ideias inovadoras reestruturassem o jeito de viver essas experiências. E as startups provaram que são capazes de unir grandes ideias e mudar a forma como a sociedade hoje vive.

As grandes características de startups de base tecnológica são a possibilidade de ganhos de escala na veiculação de um serviço ou um produto e a inerente incerteza de que esses serviços ou produtos tenham efetivamente um mercado. Escala e incerteza são típicas características da própria internet, que permitiu um avanço comunicacional sem precedentes. Avanço esse que foi de difícil planejamento, dada a própria natureza de atuação em rede que a internet apresenta. O mercado atual será o mercado antigo de amanhã e, portanto, as estruturas empresariais que não estiverem no compasso das novidades de mercado vão se enrijecer e perder o bonde. Uma prova disso é a quantidade crescente de grandes empresas que buscam inovar e empreender não apenas por seus departamentos de pesquisa e desenvolvimento, mas também favorecendo startups que tragam essas novidades de fora. O número cada vez maior no Brasil de programas voltados ao Corporate Venture, que é o investimento de capital feito por grandes empresas, é uma prova robusta.
Sem dúvida o aumento de interesse das empresas tradicionais por estarem presentes nos diversos canais de comunicação também foi um fator influenciador para a criação de muitas startups, pois esses novos canais de comunicação são novos canais de consumo. O que é o e-commerce, senão uma roupagem nova das vendas por catálogo? É isso e muito mais, claro, pois a incorporação dessas novidades e da tecnologia trouxe mais eficiência e mais entendimento do cliente. E não só vendas. Quase todo mundo com uma conta no Twitter, por exemplo, já resolveu problemas de consumo por aquele meio, o atendimento pós-venda via redes sociais é brutalmente mais rápido e eficaz. E agora a tendência vem sendo usar esse acúmulo imenso de informações para conhecer melhor o cliente e melhorar os produtos e serviços. Startups que trabalham com o chamado “big data” têm uma perspectiva sólida de sucesso ao trabalhar esses dados e transformá-los em inteligência empresarial estratégica.
Justamente pelo fato de essas tendências serem muito atomizadas, difíceis de serem identificadas em grandes estruturas, é que as startups saem na frente, porque são flexíveis e enxutas. Isso dá agilidade e poder de visualização de tendências e caminhos e, portanto, de oportunidades de mercado e de negócios. O resultado, então, é essa inversão do senso comum, de que empresas gigantescas lideram o processo de produção de tecnologias de ponta e a linha de frente, agora, é de startups que farejam com bastante antecedência o que pode vir a acontecer. O caso da Apple é paradigmático, Steve Jobs era um cara que dizia que fazia produtos que seus clientes não sabiam que iriam precisar. É uma maneira de ver o mundo. Novamente a gente pode pensar nos exemplos do Facebook e do Twitter, quem é que imaginaria que um carômetro de universitários ou uma ferramenta de recadinhos curtos iam se tornar negócios multibilionários? A resposta é simples: seus criadores, antes de todo mundo, já tinham pelo menos intuição de que suas criações iriam ser máquinas de geração de receita. E trabalharam nesse sentido, surpreendendo muita gente com um pensamento mais conservador, mais dentro da caixinha. E tudo faz parte de um processo extremamente dinâmico, em que os modelos de negócio vão evoluindo, causando uma ampliação do próprio público consumidor, ou uma reversão completa desse público.

Claro que muitas acabam indo por caminhos que se revelam errados, mas esse tipo de erro é também comum nesse ambiente. É outra quebra de paradigma: aprender com o erro é um sinal positivo e de fortalecimento, erros que seriam muito mais custosos em ambientes mais tradicionais. Se a gente está tratando de tecnologia e inovação, necessariamente a gente está falando de pensar à frente, bem à frente. As regras clássicas do marketing ainda valem, mas vão passando por uma reinterpretação. Transformar a experiência de compra numa experiência sempre foi uma necessidade, mas apresentar essa visão é algo mais recente. Uma startup deve se preocupar em não abraçar o mundo com uma ampla gama de soluções, mas fazer muito bem pelo menos uma coisa melhor do que todo mundo. Claro que não se pode parar por aí, senão o produto envelhece e o mercado consumidor migra para concorrentes ou se desinteressa pela forma como a solução foi adotada. Uma evolução contínua e sólida vai ser sempre necessária, o que pode levar à completa transformação do próprio produto. Quem diria que o YouTube se transformaria na maior plataforma de compartilhamento de vídeos a partir de um site em que você votava nas fotos de uma pessoa avaliando se eram ou não atraentes?

 

Flavio Augusto Picchi é advogado e fundador do Picchi Estúdio Jurídico.

Achei um investidor! E agora?

[Este post foi escrito a convite dos queridos amigos da Aceleratech, essa aceleradora tão incrível na qual eu tenho a honra de ser mentor. Apareceu originalmente aqui. Boa leitura!!]

 

Então, você e seus sócios deram um duro danado virando noites programando, rearranjando post-its no canvas, discutindo estratégias de marketing e user experience. Fizeram de uma boa ideia um protótipo, e daí treinaram muito aquele pitch que deu um baita trabalho no Powerpoint ou no Keynote. Eis que então – SURPRESA! – um investidor que assistiu à apresentação gostou de tudo aquilo e tem interesse em investir na sua startup.

Já há um bom tempo assessorando startups em operações de investimento, estou acostumado com a cara de desespero de alguns empreendedores nessas horas. Pior ainda, e mais triste, foi ver ou ouvir as histórias daqueles que, por falta de preparação, deixaram de receber aquele capital que poderia fazer da sua startup o novo Google. Bom, eu não vou usar a velha frase “procure um advogado”, porque isso simplesmente não resolve o problema. Antes disso é necessário que o empreendedor saiba, ao menos por cima, como é que se estruturam essas operações. Este post vai ser um pouco longo, mas espero que ele valha a leitura e traga um pouco mais de clareza quanto ao funcionamento dessas operações.

Tanto nos EUA quanto aqui no Brasil, a forma que vem se tornando cada vez mais comum é o empréstimo conversível (em inglês, convertible note ou convertible debt), especialmente em razão da dificuldade de se chegar num valuation justo na fase pré-operacional ou inicial da startup. Do que se trata? Bom, é uma mistura de dívida com investimento de capital. Significa que o seu investidor vai emprestar certa quantia para a startup e que, ao final do período desse contrato, existem duas opções: pagar o empréstimo ou converter o valor em capital da empresa. Apesar de parecer um esquema relativamente simples, existem muitos pontos de atenção e detalhes que precisam ser analisados com atenção e cautela.

Por exemplo: a ideia de receber capital de um investidor anjo é ter um volume de recursos que banque o giro das operações da startup até que o negócio esteja bem estruturado a ponto de receber uma nova rodada de investimento, normalmente por investidores mais sofisticados (especialmente fundos de venture capital, no que se conhece como Series A). Então, isso nos abre pelo menos três opções: (a) o investidor quer seu dinheiro de volta; (b) o investidor quer manter o investimento; (c) o investidor quer acompanhar o investimento do venture capitalist (“VC”).

No primeiro caso, a recomendação mais favorável ao investidor é que o contrato de empréstimo conversível estipule que depois de determinado tempo, ou de acordo qualquer outra condição futura, a conversão seja obrigatória para as partes. Assim, mesmo que a startup não seja muito bem sucedida, o investidor se torna sócio (de uma empresa que não fez tanto sucesso assim, e que eventualmente pode ser extinta). Caso contrário, a startup – e eventualmente seus sócios, se foram garantidores do empréstimo – podem ser acionados pelo investidor na justiça para pagar o débito.

Mas se a startup se tornar a menina dos olhos do mercado, o investidor pode querer manter a participação, como sócio, que seria equivalente ao valor atualizado do empréstimo. Isso pode ser combinado de antemão no contrato, e depende do valuation da startup (difícil de ser estimado, como dito acima). Por exemplo, o investidor empresta uma quantia de R$ 50 mil em troca de 10% da empresa no futuro (o que, de antemão, significa que ele, quando emprestou o dinheiro, avaliou a startup como valendo R$ 500 mil no vencimento).

Fica a pergunta: esses 10% se referem à participação antes ou depois da entrada do VC, caso haja uma nova rodada de investimento Series A? Deixar isso bem claro no contrato vai evitar uma série de discussões futuras. E esse conflito é bastante comum em contratos que não foram bem redigidos – normalmente, tanto por inexperiência quanto por afobamento das partes envolvidas (para continuar, vamos simplesmente assumir que isso estava bem combinado, e tudo caminhando bem nas conversas com o VC).

Mas também essa percentagem pode ser decidida posteriormente, quando (e se) houver uma rodada Series A. Nesse caso, nos contratos mais bem amarrados de empréstimo conversível, podem aparecer duas cláusulas bastante comuns, regulando condições importantes e que são favoráveis ao investidor inicial.

A primeira é a chamada valuation cap. Por meio dela, o investidor anjo vai converter o valor do empréstimo segundo um valuation máximo da empresa. Usando o mesmo exemplo anterior, o investidor anjo vai emprestar os mesmos R$ 50 mil, mas vai fazer a conversão em capital por um valuation máximo de R$ 1 milhão (o que equivaleria a 5% da empresa). Mas o VC avaliou a startup em R$ 2 milhões. Se não houvesse essa cláusula, o investidor anjo converteria seu empréstimo segundo o mesmo valuation do Series A, ficando com apenas 2,5% da empresa.

Outra cláusula muito comum e que também é vantajosa para o anjo (afinal de contas, ele foi o primeiro a apostar no sucesso da startup) é o discount. Por meio dela, o investidor anjo ingressa na sociedade em condições mais favoráveis em relação ao valuation que está baseando o investimento do VC – uma taxa de desconto mesmo. Se estiver previsto um discount de 25% em relação à avaliação do valor da startup feita pelo venture capitalist, isto significará que o valor que foi emprestado pelo investidor anjo vai pagar as novas ações ou quotas da startup por um preço 25% menor do que o VC vai pagar por cada ação ou quota.

Mesmo tentando simplificar ao máximo, dá para perceber que essas questões não são exatamente fáceis, e exigem certo jogo de cintura com matemática financeira (tanto que eu não fiz muita menção ao problema do valuation pós ou pré diluição – fica para uma outra oportunidade). Por isso mesmo que é necessário ter a assessoria de profissionais que tenham condições de ajudar efetivamente o empreendedor e sua startup a encontrar um ponto de equilíbrio bem negociado, justo e adequado nessas questões societárias e financeiras.

Material sobre vesting para startups

Com um pouquinho de atraso, estou colocando online os slides da apresentação sobre vesting para startups, aqui no endereço https://startdireito.files.wordpress.com/2013/11/flavio-picchi-bate-papo-vesting.pdf. Além de agradecer aos participantes do bate-papo, meu obrigado à Fernanda Nudelman Trugilho, do Pto de Contato, pelo convite!

Mas afinal, o que é o vesting? O termo, aqui no Brasil, acabou sendo entendido como o mecanismo que startups concedem uma participação societária a funcionários para estimular neles o aprofundamento do vínculo com a empresa e uma recompensa adicional (muitas vezes, principal) pelo trabalho desenvolvido. Rigorosamente falando, vesting é o direito de adquirir essa participação, após terem sido cumpridas algumas condições e passado um período de tempo.

Essa expressão também serve para se referir ao aumento da participação de sócios, founders ou não, no capital da startup. Por uma série de razões jurídicas e que decorrem das estruturas societárias diferentes que existem no Brasil e nos EUA (e em outros países de origem anglo-saxã), legalmente faz pouco sentido falar em vesting para sócios nas startups brasileiras, mas o fato é que é possível chegar às mesmas finalidades que são buscadas nos EUA e em outros países.

Em outras palavras, muito do que se vem falando sobre vesting aqui no Brasil deriva de análises feitas sobre textos e práticas americanas, de forma que às vezes o que se fala aqui não tem muita precisão do ponto de vista jurídico ou simplesmente é impossível de implantar da mesma maneira aqui. Mas como quase tudo quando se fala de contratos, os efeitos econômicos do que se quer implantar da uma forma podem ser alcançados segundo uma estrutura alternativa. É o que eu sempre chamo de “tropicalização jurídica”.

Sendo assim, é possível implantar nas startups brasileiras estímulos que acabaram conhecidos aqui como vesting – e, muito importante, independentemente se a startup é uma sociedade limitada ou sociedade anônima. Isso vale tanto para sócios quando para funcionários, mas a estruturação dessas operações é um ponto muito delicado. Primeiro pela necessidade dessa “tropicalização”, que exige conhecimento profundo das práticas no exterior e do ambiente jurídico e negocial brasileiro. Segundo porque se acontecer um passo em falso, e a implementação do vesting pode ser prejudicada. Um bom exemplo: a estrutura errada pode fazer com que o vesting para funcionários seja considerado uma remuneração salarial, e com isso a startup, em vez de ganhar um funcionário aliado, ganha uma contingência trabalhista e previdenciária enorme, com reflexos financeiros e até mesmo criminais em alguns casos!!

Acima de tudo, a implementação de um programa de vesting deve ter como premissa a estabilidade das regras (aliás, como quase tudo na vida, a segurança do que está contratado é uma das melhores garantias de sucesso). Não adianta nada um plano lindo no papel quando, no momento de um funcionário receber uma participação ou de um sócio ampliá-la, os demais envolvidos deem para trás e descumpram as expectativas que haviam sido criadas. O mesmo vale para os beneficiários: vesting é um meio para se tornar sócio e, assim, exige que o contemplado tenha mentalidade de dono e empreendedor, não de investidor interessado num renda.

Eu tenho visto muitas discussões em fóruns de internet sobre vesting nas startups brasileiras, então pretendo voltar ao assunto mais algumas vezes. Para isso, quem tiver dúvidas e questões para serem respondidas, é só me mandar uma mensagem! Quem sabe não vai ser a sua startup que vai adotar o vesting em 2014?

Flavio Picchi – Bate Papo Vesting

Entrevista para o Estadão: Economia Colaborativa

O assunto “equity crowdfunding” está bastante em voga, e depois das recentes referências pessoais minhas no Valor Econômico (link), Startupi (link)  e Diário do Comércio (link), agora houve uma recente publicação especial do Estadão.

Foi um pequeno “quote” no caderno especial de economia colaborativa, mas serve como reconhecimento (para mim mais que honroso) do trabalho de consultoria a startups, investidores-anjo e empreendimentos inovadores, que venho desenvolvendo desde o começo do ano. Tenho muita fé nesse setor e no seu papel para a economia brasileira, especialmente no período mais tumultuado que se aproxima.

O caderno especial foi um trabalho excepcional dos trainees do Estadão (a quem muito agradeço). Os links diretos estão aqui: para o caderno completo (link)  e para as questões de “crowd equity” (link). O PDF da página inteira está também disponível aqui nos arquivos do blog (http://goo.gl/lscx99).

Meu artigo no Valor Econômico: equity crowdfunding

Hoje o Valor Econômico publicou na seção “Legislação e Tributos” um artigo da minha autoria, sobre a captação de recursos para pequenas empresas e startups por meio de crowdfunding. Como o acesso ao site é para assinantes, coloco aqui a transcrição do artigo e um arquivo PDF: Flavio Picchi – Mercado de capitais para microempresas. O link original para o artigo é http://www.valor.com.br/brasil/3017560/mercado-de-capitais-para-microempresas.

Como já falei por aqui, o equity crowdfunding é uma tendência mundial, e  é sempre bom saber que esse mecanismo já pode ser usado no Brasil. Todos os comentários são muito bem-vindos!

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22/02/2013 às 00h00

Mercado de capitais para microempresas

Por Flavio Augusto Picchi

Em abril de 2012 ocorreu a aprovação do “Jumpstar Our Business Startups Act” (JOBS Act), lei americana cuja finalidade principal foi estimular o financiamento de micro e pequenas empresas (MPEs) por meio do mercado de capitais, o denominado “equity crowdfunding”. Crowdfunding é a denominação do processo de captação de recursos para financiamento de projetos diversos, normalmente por meio de plataformas digitais. O marco regulatório ali ainda não está completo, pois falta à SEC, equivalente da nossa Comissão de Valores Mobiliários (CVM), a edição de diversos dispositivos.

Sem entrar em profundas análises sobre o ambiente americano, o fato é que os termos do Jobs Act vêm despertando críticas de interessados, pois a pretendida simplificação e incremento do acesso das MPEs ao mercado parece ser complexa e limitada. Ainda assim, o acontecimento já desperta interesse no Brasil, ensejando discussões e oportunidades para que MPEs nacionais façam uso de instrumentos semelhantes. E Pode parecer curioso que o regime legal para emissão de valores mobiliários por MPEs no Brasil seja apontado como paradigmático.

Grande parte dessa conclusão deve-se à posição inovadora que a CVM teve na questão, fruto dos comandos constitucionais e legais que informam as políticas públicas nacionais em relação às MPEs. Com a edição da Lei Complementar nº 123 em 2006, foram assentadas as bases necessárias, atendendo à determinação contida desde 1988 no art. 179 da Constituição. Comprometida em atender àquelas políticas, simplificando o acesso ao mercado de capitais, a CVM passou a editar Instruções para alcançar esses objetivos. Em especial, podem ser citadas as Instruções CVM de números 473, de 2008, 476, de 2009, 480, de 2009 e 482, de 2010.

Soluções criativas podem ser adotadas para viabilizar esse tipo de financiamento

A dispensa automática de registro para emissões de MPEs foi adotada na Instrução CVM nº 480, de 2009, a partir de sugestão formulada pela própria Superintendência de Registro de Valores Mobiliários da CVM, no contexto da Audiência Pública nº 07, de 2008 – que colheu sugestões para sua redação final. Com relação à Instrução CVM nº 482, de 2010, a própria autarquia, no relatório da audiência pública nº 01, de 2009, reforçou seu compromisso em assegurar tratamento diferenciado às MPEs, mantendo “a dispensa de registro de emissão e de submissão a um regime informacional mínimo”, medida suficiente para “garantir a supervisão e transparência em ofertas de emissores de micro e pequeno porte”.

Assegurada a dispensa de registro de emissão, conforme o art. 7º da Instrução CVM nº 480/09, basta o cumprimento das exigências estipuladas pelo art. 5º e pelo Anexo IX da Instrução CVM nº 400/03 (na redação conferida pela Instrução nº 482/10). Também devido a esse regime privilegiado, as obrigações correlatas aos demais emissores são dispensadas, como o formulário de referência e o de informações trimestrais.

Duas principais dúvidas que poderiam ter lugar são solucionadas segundo os termos do referido Anexo IX da Instrução CVM 400. Não há necessidade de instituições intermediárias no processo de oferta pública (conforme permitido pela Lei nº 6.385, de 1976), assim como não se exige que a emissora seja constituída como sociedade anônima. Essa possibilidade está em linha com a própria definição legal de MPEs – que exclui do conceito, entre outros casos, empresas constituídas sob essa forma societária.

Já é possível perceber que as regras de captação de recursos por MPEs brasileiras mediante emissão de valores mobiliários é surpreendentemente simples mas, disponível desde 2010, ainda é mecanismo inédito, até onde se sabe. A CVM possibilitou a captação de recursos para MPEs via equity crowdfunding, antes mesmo que esse novo conceito fosse formulado. Num país em que se alega que o mercado de capitais é pouco desenvolvido, é notável a adoção de soluções práticas e adequadas, a compor um marco regulatório exemplar a outras nações, mesmo mais desenvolvidas.

Na prática, soluções criativas podem ser adotadas para dar viabilidade esse tipo de financiamento. Títulos de dívida, como notas comerciais, podem ser lançadas por emissoras constituídas como sociedades limitadas (tal como prevê o art. 33 da Instrução CVM 400), em substituição às debêntures, cuja emissão é restrita a sociedades anônimas. Títulos de investimento coletivo podem ser emitidos garantindo participação em lucros ou com lastro em quotas de sociedades limitadas, com nomeação de um agente fiduciário. São apenas alguns primeiros exemplos para esboçar possibilidades.

A experiência efetiva dessas emissões dirá se os caminhos regulatórios são eficazes, ou se aprimoramentos são possíveis. E, mais importante, poderá proporcionar subsídios para fomentar o debate sobre meios de diminuir as barreiras ao investimento em startups, empresas inovadoras e de alto potencial. A discussão não pode deixar de levar em conta eventuais alterações na legislação tributária para incluir, em especial, incentivos e diferimentos fiscais, como já vem defendendo o Programa de Aceleração do Crescimento para Pequenas e Médias Empresas (PAC-PME).

Flavio Augusto Picchi é advogado especialista em direito societário, bacharel e mestre em direito internacional pela Universidade de São Paulo

Este artigo reflete as opiniões do autor, e não do jornal Valor Econômico. O jornal não se responsabiliza e nem pode ser responsabilizado pelas informações acima ou por prejuízos de qualquer natureza em decorrência do uso dessas informações

Porque o investimento em startups vai subir em 2013

Eu não sou a Mãe Dinah, e talvez justamente por isso eu possa tentar fazer previsões que não dependam de pura mágica, mas da análise de alguns fatos. Minha opinião é de que em 2013 vai ter muito mais dinheiro disponível para investimentos em startups. Vamos analisar as bases dessa afirmação.

1. Bancos de investimento em baixa. Ano passado foi um ano difícil para os bancos de investimento. As operações de equity (participações societárias) secaram devido à atividade baixa: quase não houve IPOs e as movimentações de fusões e aquisições se deram mais no ambiente privado, fora de bolsa, por desinvestimentos de fundos (FIPs e FMIEE). Nisso, a receita por fees desses bancos diminuiu bastante. No mercado de debt (dívida), a concorrência foi gigantesca, com várias operações de captação, mas os fees dos bancos foi jogado na bacia das almas: os exemplos da Eletrobras, Taesa, Cemig e Oi (todos em 2012) falam por si: os bancos chegaram a cobrar singelos R$ 0,01 para realizar emissão de debêntures.  Emissões de dívida (que estão mais baratas: queda dos juros, como alerto mais abaixo) quebraram o mercado de emissão de ações, e mesmo operações de aquisições de empresas não foram financiados via equity. Os dados da Anbima (associação que reúne os bancos de investimento) confirmam esse ambiente, conforme notícia do Valor Econômico de 16.01.2013:

o ano passado foi muito restritivo para a renda variável, com apenas três ofertas iniciais de ações e dez subsequentes. O volume captado, de R$ 14,3 bilhões, foi o menor desde 2005 e abaixo dos R$ 18,9 bilhões vistos no ano anterior. Em contrapartida, o ambiente mostrou-se favorável às emissões de debêntures, que cresceram 71% e totalizaram R$ 86,6 bilhões”.

Entre as consequências dessa inatividade e baixo retorno para os bancos, está o fato de que, não apenas em nível mundial, mas também no Brasil, o quadro de funcionários de bancos de investimento está sendo enxugado. Aparentemente, o Deutsche Bank demitiu todos os funcionários de sua área de investment banking no final do ano passado. Mundialmente, o Morgan Stanley anunciou agorinha mesmo a demissão de 1.600 colaboradores das áreas de investimento. Os reflexos desse contexto devem se repetir aqui no Brasil. O Wall Street Journal lembra que o problema não é apenas do banco alemão:

“A maioria dos bancos eliminou milhares de empregos nos últimos anos, agora que as dificuldades da economia americana e as dúvidas persistentes sobre a saúde financeira da Europa prejudicam os negócios. A atividade em importantes setores mobiliários, desde subscrição de ações até consultoria para fusões e comércio, está bem abaixo dos níveis anteriores à crise financeira. (…) As receitas de banco de investimento na Alemanha, o segundo maior mercado europeu depois do Reino Unido, caíram cerca de 20% até o fim do terceiro trimestre, para cerca de US$ 1,74 bilhão, segundo a firma de dados Dealogic. As receitas caíram para menos da metade de seus picos de 2007. No Reino Unido, as receitas de banco de investimento caíram 12%, para US$ 2,4 bilhões, nos três primeiros trimestres deste ano [2012].”

 2. Baixa dos juros no Brasil. Ontem mesmo, o Copom anunciou que vai manter a taxa básica de juros em módicos (para padrões brasileiros) 7,25% ao ano. Nunca foi uma taxa tão baixa assim. Quem estava acostumado a tirar 15% ao ano com títulos da dívida pública, só apertando botões agora precisa tirar leite de pedra e suar muito para ter uma rentabilidade bem menor do que isso. A saída, claro, é diversificação de investimentos, de maneira a buscar aplicações que tenham maior retorno e, portanto, maior risco. Quem trabalha em investimentos está botando o time em campo para descobrir alternativas rentáveis para compor as carteiras de investimentos, que não se contentam mais com aplicações seguras de renda fixa.

3. Conclusão preliminar. É possível que quem trabalhe em bancos de investimento esteja tentando aplicar os conceitos de finanças para analisar a própria carreira. Pouca perspectiva de crescimento e emprego nos grandes players (taxa de retorno baixa e não exatamente segura) pode levar muitos trabalhadores na área a aproveitar suas qualidades e redes de relacionamento para empreender. Em outras palavras, minha impressão é de que vai ocorrer, e já está ocorrendo, uma movimentação de pessoas que deixam as áreas de investment banking em grandes corporações e montam suas próprias empresas de administração de recursos (maior risco mas maior expectativa de retorno). Isso está em linha com a demanda do mercado de diversificação de investimentos. Novos gestores de carteira, atuando independentemente, têm muito mais incentivo a buscar empreendimentos que gerem grandes retornos, ainda que impliquem muitos riscos.

4. Evidências. Se alguém falou a palavra “startups” neste momento, acho que está fazendo coro comigo. Mais uma evidência desse movimento: o anúncio, feito ontem mesmo, de que a IdeiasNet quer atuar como gestora e está montando um fundo de investimento com recursos que podem variar entre US$ 100-150 milhões. A IdeiasNet é conhecida por ser uma empresa de branding, com investimentos nas áreas de moda e inovação. Até agora eles investiram recursos próprios, mas como estão com o faro treinado depois dos investimentos que fizeram, faz todo o sentido que essa experiência seja usada para continuar identificando oportunidades e ganhar dinheiro para novos investidores com esse modelo de atuação.

Se meus palpites estão certos ou não, o tempo vai dizer. Mas com certeza, e mais que nunca, é hora de os empreendedores ficarem atentos à gestão de seus negócios e na busca de novos relacionamentos comerciais que permitam expor ao mercado as atividades que estão desenvolvendo.

Mas afinal, que diabos é um term sheet?

Como o próprio nome em inglês indica, um term sheet é uma folha, em que constam condições e termos mínimos para que se faça algum tipo de transação ou investimento. Isso significa que vou receber um investimento? Não, por pelo menos dois motivos.

Normalmente os term sheets são não vinculantes (non-binding), ou seja, eles não obrigam que as partes realizem a operação que está rascunhada nele (exceções: cláusulas como confidencialidade sobre os entendimentos, exclusividade, despesas, entre alguns outros). Mas mesmo que o term sheet seja vinculante (binding), nele existe um tópico denominado “condições precedentes” (conditions precedent). Isso significa que a realização da operação vai depender de algumas condições; por exemplo, que o veículo de investimento não tenha passivos (ou tenha poucos), e que uma auditoria seja realizada pelo investidor interessado, com resultados considerados aceitáveis para ele.

Em posts futuros, vou aprofundar os principais termos e conceitos mais comuns que existem em term sheets. É bom lembrar que os term sheets podem ser chamados de diversas formas: memorando de entendimentos, carta de intenções, termos mínimos para financiamento, acordo de intenções, entre outros.

Como sempre, a intenção aqui é de esclarecer. Se você tiver alguma dúvida ou quiser fazer uma pergunta, é só deixar um comentário ou mandar um tweet para @StartDireito.